Coimbra, 1941

biografia

1941 Pensa entrar na Escola do Exército mas desiste dos cursos preparatórios militares na Faculdade de Ciências e presta provas de aptidão à Licenciatura em Ciências Histórico-Filosóficas, tendo sido admitido

1944 Conclui o 4º ano da licenciatura em Ciências Histórico-Filosóficas

1945 Frequenta o Curso de Oficiais Milicianos

1946 A 23 de Julho conclui, com 18 valores, a licenciatura de Ciências Histórico-Filosóficas defendendo a tese intitulada O Idealismo Absoluto de Hegel ou O Segredo da Dialéctica

1947 É convidado, pelo Prof. Joaquim de Carvalho, para Assistente (20 Outubro 1947-20 Outubro 1953) do Curso de Filosofia da Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra
– Presta serviço militar na Guarda, como alferes miliciano, no Batalhão de Caçadores 7
Antigo edifício da Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra
Tempos de Coimbra
A mitologia coimbrã existe e eu naturalmente ignorava, quando cheguei aqui, em 1940, que ia entrar num mundo com outras regras e outros ritos (...). Na minha aldeia havia três estudantes de Coimbra e que eram uma espécie de aparições quando vinham de férias e nos traziam notícias do que nós não sabíamos e contavam grandes aventuras... continua...

In Colóquio "Eduardo Lourenço: as paisagens matriciais e os tempos de Coimbra", 26/04/2012, in Revista Iberografias nº8 (2012), Guarda, Centro de Estudos Ibéricos
Eduardo Lourenço com os irmãos na Quinta da Ribeira, Coselhas, Coimbra.
Algumas páginas de uma Agenda de 1943
Livro de Curso de Eduardo Lourenço

Certidão das classificações obtidas nas várias cadeiras da Licenciatura de Eduardo Lourenço em Ciências Histórico e Filosóficas

Diploma de Funções Públicas quando da contratação de Eduardo Lourenço para 2º Assistente da Faculdade de Letras, 1947

Requisições de livros na biblioteca da Faculdade de Direito e na Biblioteca Geral da Universidade
“[…] Cheguei a Coimbra com o máximo de ilusões que um estudante pode ter, convencido de que a Universidade ia abrir-me um futuro, ia dar-me horizontes pelos quais inconscientemente todo o adolescente suspira. E descobri cedo que, com uma ou duas excepções, que sempre existem no sistema universitário, me encontrava dentro de um sistema pedagógico e de um discurso extremamente fossilizados […] Devo dizer, em nome da verdade, que o ensino da filosofia propriamente dito não foi aquele que me suscitou a decepção universitária-tipo de que falei há pouco. Entre 1940 e 1945, quando fiz o meu curso, a história e filosofia estavam unidas, e era essa ligação que era mais criticável. Em Coimbra, era no campo próprio dos estudos históricos que o estudante tinha razões para considerar que esse ensino não tinha aquela qualidade universitária a que podia aspirar legitimamente. Não que, em geral, esses mestres não soubessem ou não dominassem certo campo. O que acontecia era que a maioria deles separava a investigação erudita, em que eram mestres, do ensino propriamente dito […] Não havia comunicação entre a actividade própria do professor enquanto erudito e a do professor que dava realmente a sua aula. A aula era dada como um eco de livros mais ou menos reconhecidos e em voga no plano internacional. Não havia, portanto, nesse capítulo, verdadeira inovação ou verdadeiro trabalho pessoal.

Quanto à filosofia, havia, no meu tempo, uma espécie de clivagem que, se fosse abertamente cultivada, e confessada como tal, teria sido interessante […] A filosofia era praticamente sempre a filosofia dos outros. Havia naquele tempo um semestre de História da Filosofia em Portugal, mas era uma cadeira menor e mesmo essa matéria era perspectivada de um ponto de vista da erudição mais do que de um ângulo em que se pudessem realmente discutir os problemas profundos da realidade portuguesa”.

In Eduardo Lourenço Cultura e política na época marcelista, entrevista de Mário Mesquita, 1966 Lisboa, Edições Cosmos, pp. 30-32.

Ficha de inscrição de Eduardo Lourenço no CADC, 1940.

LMQ - Em 1940 vai para Coimbra, para a Universidade.
EL - É o tempo em que andamos à procura da nossa própria definição e somos muito marcados pelos encontros que fazemos. Coimbra já me existia antes de ir para lá, porque havia na minha aldeia dois estudantes universitários que falavam muito daquela mitologia coimbrã. E já sabia que existia lá o famoso CADC, o Centro Académico de Democracia Cristã, porque o abade da minha aldeia recomendara à minha mãe que eu não deixasse de o frequentar. Era então o alfobre dos futuros quadros do regime. Frequentei o CADC durante um ano e fiz lá amigos, como o Henrique Barrilaro Ruas. Depois conheci no primeiro ano de Letras essa geração que se chamou neo-realista: o Rui Feijó, o Carlos de Oliveira, o Egídio Namorado, o Raul Gomes entre outros.
In Luís Miguel Queirós “Retrato de um pensador errante” in Publica, 13/5/2007, pp.43-44.

Cartas aos Novos, de Gonçalves Cerejeira
Carlos de Oliveira, Fernando Namora, Rui Feijó e colegas

28.9.47
Hoje durante toda a meia tarde até ao anoitecer conversei com o Carlos [Oliveira] como raras vezes me tem acontecido conversar com alguém, mesmo com os mais queridos dos seres. Já muitas vezes tínhamos falado e discutido (às vezes altas horas da manhã, o dia aflorando do silêncio do fim da noite) sobre a mesma coisa mas hoje tudo foi diferente, não pela minha parte mas pela dele. Ele estava maçado da viagem a Lisboa e da estadia aí de 3 dias onde foi buscar a Ângela e talvez pelo ar sério que a vida da rapariga introduziu na sua vida, tinha uma disposição diferente para ouvir d’uma maneira humana aquilo que costuma ouvir à procura de polémica.
Falámos da melancolia do nosso destino individual, da tristeza da nossa vida social, do afundamento de toda a confiança e de toda a esperança e através de tudo e apesar de nós próprios falámos sempre do amor e da morte. Sobretudo da morte. A ele impressiona o desaparecimento de todo o viver físico, a corrupção da carne, a mim tudo ao contrário, impressiona-me a presença permanente da morte como sombra que devora já neste instante a minha própria vida. Para mim não é nada que esteja lá no fim da rua esperando-me mas uma sombra que caminha dentro de mim e me obriga a certos rodeios e certas hesitações nos caminhos que vou seguindo.

ms. inédito, em pequeno bloco de notas.